QUEREMOS SABER

Lendo em voz alta
Por : Franciane Nolasco

Recentemente me lancei à tarefa de ler mais para minhas filhas. Encarei a tarefa primeiramente como uma necessidade de evolução e esforço meu enquanto mãe de transmitir a elas um bom hábito. De instalar em nossa rotina o hábito de lermos juntas ao menos 30 minutos por dia. Criamos para nós mesmas um momento aconchegante e de conexão onde viajamos por um universo compartilhado. Em um primeiro momento, minha preocupação foi a de trazer minhas filhas para dentro das relações com os livros que já possuo. Elas me vêem por aqui e por ali pela casa sempre lendo alguma coisa, sendo na maior parte das vezes coisas do meu trabalho.
Em vários períodos da minha relação com minhas filhas eu me pego pensando em como podemos criar momentos de conexão dos nossos interesses. Pois, uma vez que elas são tão diferentes de mim e têm seus próprios interesses, como podemos habitar em uma casa em que tenhamos nossos momentos de diversão juntas, feitos especialmente por aquilo que nos fala ao nosso Ser? Essa relação para mim, implica em um certo cuidar. Não o cuidar das funções fisiológicas, como o vestir, alimentar e caminhar. Tampouco o cuidar das emoções, como o acolher e o ouvir. Mas, aprendi, principalmente, que é um cuidar da solidão. Dedicar um tempo da sua vida a estar junto a criança que não em contextos dos cuidados básicos, é enviar uma mensagem a ela: eu me interesso por você e estou aqui.
Criar um momento especial rotineiramente com minhas filhas me fez perceber que conexão é o que mais precisamos enquanto seres humanos. Uma conexão que possa contemplar as diferenças pessoais, e que a criança possa mostrar seu mundo ao adulto e vice-versa, em que ela possa sentir que alguém do mundo adulto pode se conectar profundamente com ela, ouvi-la, compartilhar descobertas e conhecimentos numa via de mão dupla permitindo a ela que manifeste seu ser e seja acolhida em sua espontaneidade - fazê-la sentir-se amada por isso. Esta conexão não existe sem presença. É uma fórmula muito simples, que todos nós já sempre compreendemos, mas muito difícil de executar. Principalmente nos tempos modernos, onde os adultos encontram-se muito atarefados com tantas demandas para dar conta ou sugados pelas bolhas das mídias sociais.
Portanto, não estou escrevendo com uma psicóloga que veio aqui lhe dizer o quanto é cientificamente comprovado que as crianças precisam da sua disponibilidade de presença para se desenvolverem melhor. Pois assim, acredito que estaria acrescentando mais uma exigência a sua lista de exigências consigo mesm@, e uma das grandes. Eu venho apenas enquanto mãe, compartilhar que podemos encontrar uma dimensão enorme da nossa existência se abrirmos a possibilidade de nos conectarmos de verdade com nossos filh@s. Com algo que faça sentido para nós e para el@s.
Temos habitado milhares de mundos, imaginado universos fora das telas em que nossa imaginação e fantasia são estimulados por escritores e seus personagens que aprendemos a amar juntas. Recentemente finalizamos a saga do Harry Potter. Minha filha mais velha temia os filmes do Harry Potter. Ela sempre foi muito sensível às imagens fortes que os filmes realmente contém. No entanto, pelos livros, ela mesma criou o seu mundo dos bruxos com suas próprias matizes. Foi e ainda é indescritível o prazer de acompanhar uma paixão em seu estado nascente, a excitação saltitando pelos olhos, as risadas e os choros compartilhados. E ainda, após finalizarmos a saga, sempre há outros mundos maravilhosos e completamente diferentes para descobrirmos nos nossos 30 minutos por dia.
Além da leitura entre nós, devido ao contexto da pandemia e da diminuição de contato com os avós, incluímos a família na leitura. Os avós das meninas sempre encontram uma forma amável e interessada de participarem do mundo delas gravando aqui e ali trechos do livro para que todas possamos ouvir. Já imaginou como é a sensação para uma criança de ser amada ao receber do mundo em sua volta a atenção, interesse e partilha para um assunto que lhe encanta? Com essa experiência, aprendi não apenas a lermos juntas e cultivar o hábito da leitura, mas também a abrir uma via de conexão com elas pela qual podemos caminhar através dos interesses que possuímos.
Crescendo juntas, cada uma em sua diferença.